Esses dias me deparei com um desses posts de rede social que citava Voltaire, dizia algo como “A decisão mais corajosa que você pode tomar a cada dia é de estar de bom humor” (tradução livre do francês). Na hora lembrei de mamãe que sempre reclamou (com razão) de seus filhos quando estavam de mau humor. Gente de mau humor e que só reclama não é agradável de conviver.
Manter o bom humor é um ato de coragem. Quando o mundo se abre debaixo dos seus pés, quando você convive com doenças crônicas, quando os problemas batem à porta todos ao mesmo tempo, a primeira coisa fácil de se perder é o bom humor – em seguida a gente perde a esperança, perde a cabeça, perde o sono e muito mais.

Como manter o bom humor diante das agruras da vida? Se fosse fácil, tinha youtuber fazendo vídeo com dicas. Porque o difícil nisso tudo é ser corajoso e coragem não se compra por aplicativo.
Sim, o bom humor é só uma desculpa pra falar sobre algo tão nobre: a coragem. Cultivar o bom humor nos torna pessoas mal compreendidas, porque precisa uma boa dose de capacidade de interpretação e raciocínio ágil para acompanhar o deboche, a ironia, as metáforas, o rir de si mesmo e o bom humor cotidiano das pequenas coisas. Nem todo mundo consegue. Decidir manter o bom humor todos os dias, diante de qualquer circunstância, é dizer não ao mal que se aproxima. De certa forma, sofrer com um sorriso nos lábios (e uma boa piada) é mais agradável.
A coragem é aquela coisa, já ensinei em tantas aulas de Filosofia, que fica entre o ser temerário e o ser covarde. Os sentimentos equilibrados são os mais nobres que podemos alcançar, posto que é fácil ser covarde (fácil demais) e fácil ser temerário, sendo que ambos podem cobrar o seu preço – para os covardes, o preço pode ser pago na justiça e para os temerários pode custar-lhes a própria vida.
O covarde lança mentiras e calúnias ao vento, sem se dignar (se tivesse dignidade não seria um covarde) a apresentar provas. Caso tivesse provas e coragem, faria denúncias pelos meios legais, faria valer as leis e acionaria os responsáveis. Como é covarde, se utiliza do que tem (por vezes só a sua voz e uma conta nas redes sociais) para semear a intriga, a dúvida, a fofoca. É um covarde porque não age, só levanta suspeita e late. É comum observarmos nos covardes um comportamento semelhante aos contaminados pela raiva: espumam, latem, rosnam e podem contagiar quem se aproxima deles. Mas, vejam só, a raiva pode ser evitada com uma simples vacina, porém, quem se contamina tem alta chance de morrer. A raiva mata. A covardia só estigmatiza quem profere seus discursos de raiva e frustração: ao passar na rua poderá ser apontado “aquele é um covarde”. E assim será para toda vida.
Ser corajoso é não se calar. Quem tem a coragem dentro de si não baixa a cabeça para os covardes, não se intimida pelas mentiras e acusações, não flerta com o desespero. A coragem nos permite tomar as atitudes necessárias para punir quem, imbuído da sua covardia tão comum nos nossos dias, ultrapassa os limites da sua profissão e do seu cargo e saí por aí destilando ódio a quem nada tem a dever – que exerce sua cidadania em plenitude e pode provar.
Curioso observar que esses covardes dos nossos dias têm uma preferência em atacar mulheres no exercício da sua profissão e liberdade de expressão, o que os torna um tipo especial de covardes: os covardes misóginos, sexistas e, cá entre nós, do século passado. Parece que nos dias de hoje ser covarde já é, em si, algo fora de moda – são como defuntos que andam por aí espalhando o odor fétido da podridão que sai das suas bocas.
Como descendente de uma linhagem de corajosos, fico feliz em manter o bom humor, todos os dias (não sem esforço) diante dos covardes. Mais do que qualquer alusão a sangues nobres deste ou daquele país, faço questão de ressaltar as qualidades que fazem de mim quem sou hoje, faço questão de relembrar meus avós, meus pais, tudo o que me ensinaram para ser alguém que não se intimida diante da covardia.
É triste pensar que os covardes não estão em extinção, mas como a raiva alimenta os fãs dos covardes, satisfaz saber que há vacinas (fugir da ignorância, do discurso de ódio, procurar ouvir e ver além de vídeos curtos com gritos histéricos publicados por aí), porém a raiva mata – infelizmente ela mata porque o mal toma todo o ser com muita rapidez, a raiva impede a pessoa de enxergar e de pensar, ela morde até os seus entes queridos. Por isso, é imprescindível evitá-la.
Os covardes cairão pelo próprio veneno que destilam. Enquanto isso, caminham trôpegos como zumbis de um apocalipse de difamação e injúrias que criam no seu tempo livre. Ser corajosa é sempre ter voz diante deles, é tomar as medidas cabíveis, é buscar apoio em quem está ao redor, é fazer valer as leis e os direitos que nos protegem. Por vezes, ser corajosa é dizer o que ninguém se atreve a dizer, é criar e fabular mundos nos quais existem coisas abomináveis, é contar para os outros o que pode acontecer caso os covardes se apoderem do nosso mundo – e, pra isso, vale compor uma canção, escrever um livro ou fazer um filme.
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