Las lobas siguen enamoradas

Duas das últimas obras lançadas que me fizeram feliz foram o “filme” da JLo e o álbum da Shakira. São duas latinas às quais eu acompanho a carreira (sem nenhum vício deselegante) e gosto do trabalho. Ambas abordam os mesmos temas nessas obras que é a mulher “madura”.

E hoje é sobre isso. Sobre termos produções culturais e artísticas para um público muito específico que é o da mulher independente adulta além 30 anos. Fiquei pensando por quanto tempo, ao longo da História, faltaram produções que fossem destinadas a mulheres acima de 30 anos que encaram a vida longe da perspectiva que nos destinaram a essa idade (marido, filhos, estabilidade mental e financeira, dona de casa ou carreira em dia). Mesmo para as mulheres que tenham caído no conto de fadas, por volta dos vinte e pouco anos, de vida feliz com marido, filhos e dona de casa ou carreira estável (tendo tido ou não a chance de estudar), a casa dos trinta pode ter trazido novidades – o conto era de fadas mesmo e o príncipe era um vilão, os filhos dão trabalho e crescem e têm suas vidas, por vezes ela era dona de casa para dar conta do maridão e dos filhos e numa separação teve que se ver sozinha, sem estudos e sem profissão, a correr atrás do prejuízo. 

Quem nunca assistiu a filmes, séries, leu livros sobre homens e suas eternas crises, dos 15, 18, 20, 30, 40, 50, 60, 70, 80… até parece que homem vive em crise, né? (não sou eu que estou dizendo)

Mas a mulher com mais de 30 é uma pessoa muito especial. E para aquelas que ainda não passaram por nenhum processo de transformação na casa dos trinta, já aviso: ele virá. Sei lá, a mulher balzaquiana é clássica, mas é escrita por um homem, né? 

Os trinta, nas vozes da JLo e da Shakira, é sobre mulheres muito fortes – e fracas. Elas conseguem revisar suas fraquezas. As mulheres que se transformam aos trinta sabem no que, quando e com quem erraram – e se perdoam por terem errado porque o “erro” é parte da nossa jornada, quando erramos não fomos as únicas protagonistas da história e não havia ninguém nem nada que pudesse ter previsto o que nos traria essa experiência. Durante os vinte nós podemos (e devemos!) errar. Depois dos trinta também erramos, só que de forma diferente – até o limite que nos damos permissão para errar. Até o limite de entender como fomos condicionadas a interpretar diversas situações que antes não eram tão evidentes e as quais ninguém se deu ao trabalho de nos explicar – mesmo que tenhamos lido ou ouvido falar, quando passamos por essas histórias é muito diferente.

Ao contrário dos homens, que aparentemente têm crises a cada cinco ou dez anos desde a tenra infância, as mulheres não têm tempo nem são autorizadas pela sociedade a ter crises. Às mulheres não é facultado errar, afinal desde cedo elas já são programadas para serem boas filhas, boas alunas, excelentes donas de casa e mães, e serão modelo de esposas – ah, e se der tempo e todas as convenções da sociedade permitirem, também devem ser profissionais zelosas (mas sem muita ambição, porque isso está destinado aos homens). Muitas de nós acreditam nessa programação em vários momentos da vida. Todas nós já nos vimos nesses papéis em diversos momentos da vida – como boas filhas, como mães, como esposas, donas de casa, etc. – por pressão externa ou interna. Algumas de nós, contudo, não se resignam a eles e, por vezes, buscam algo além.

Ou, como nos mostram JLo e Shakira, aceitamos esses papéis – e lá vem os 30 + a nos dizer que podemos nos reinventar, que o conto de fadas acabou, que as felicidades inventadas não sobrevivem, que é possível sermos nós (e tantas outras). JLo me impressiona, ao contrário do que normalmente as pessoas e a imprensa falam (que se impressionam pelo físico dela para a idade que tem – sim, 2024 e ainda falamos disso), por ser uma mulher que ama. Isso, a frase acaba aí. Uma mulher que ama. O que a idade tem a ver com isso? Qual a lei que diz que aos 30 + não podemos amar como aos 15 ou 20? (quando eu passar dos 40 + eu voltarei a escrever sobre isso) Para uma mulher que ama, o amor não é diferente em nenhuma década da vida. O amor é sempre amor, a paixão também. 

O início e o fim do filme da JLo são muito marcantes, sobre sempre ter desejado ser apaixonada e terminar numa bela sequência, cheia de referências, sozinha e cantando na chuva. Aliás, tenho me pegado pensando bastante sobre a solidão – um dia escreverei um tratado. Uma mulher sozinha é sempre vista com pena, é condenada, pelos olhos alheios, a ser triste. Já vi muita jovem de – 20 desesperada por “ficar sozinha” e me afligi demais por elas – por outro motivo. Como continuamente nos fazem crer que ficar sozinha é algo tão ruim! (seria uma ideia fabricada pelo patriarcado para que sempre busquemos homens, aceitando qualquer relação, qualquer um? mera reflexão) É por temer ficar sozinha, por se angustiar em não representar o que esperam de nós, que a mulher busca relacionamentos de forma inconsequente. Em algum momento eu espero que toda mulher tome consciência disso.

Depois dos 30, é uma vantagem apreciar a solidão. Sobre amar depois dos 30, a pessoa precisa entender o quão privilegiada é de partager* a nossa companhia. Não é desespero, não é falta de opção. Querer a presença de alguém que rompa a nossa relação (mesmo que por algumas horas) saudável com a solidão é um privilégio e um prêmio que a mulher de 30 + dá a algumas pessoas. Eu sugiro não desperdiçar.

Com minhas amigas sempre brinquei sobre o “controle de qualidade”, é preciso ter um controle de qualidade – e aí ou você é muito exigente (já me acusaram muito disso) ou você acredita demais nos seus parâmetros. JLo e Shakira me falaram sobre tudo isso, sobre passar dos trinta e tomar consciência de que “erros” não são erros, que acreditar é um dom do ser humano, que sermos enganadas, manipuladas, agredidas são consequências de quem os outros foram conosco – e não é culpa nossa. Porém, mesmo que a gente não use essas experiências para ganhar (mais) alguns milhões, que saibamos ter a coragem de nos permitir amar – de novo. 

Como diria a protagonista (Binoche, mon amour, quelle merveilleuse actrice !) de La passion de Dodin Bouffant, eu me sinto no Verão da vida. Sei lá, isso de estar no Outono da vida é coisa para homem na crise dos quarenta ou cinquenta anos. O filme é encantador em vários sentidos – e para os sentidos – e abriga uma personagem perspicaz. Ela nunca aceitou casar, assumir o relacionamento (e o filme não está preocupado em aprofundar isso – eu gostaria) e se manteve fiel a ser fiel a ele. O mais encantador é a Fotografia e a Direção se aprofundarem nesse deleite que é o Verão da vida da personagem, não importa a sua idade. Depois de tanto falar aqui em 30 +, acho que é isso: o nosso Verão dura muito mais do que querem nos fazer crer (do que sempre nos fizeram crer, até a biologia).

Como Eugenie, também amo o Verão (mas concordo com Bidon sobre apreciar a mudança das estações). O Verão é essa estação que nos faz sempre querer estar em movimento, em aproveitar a vida, nos faz querer amar, o sol dá vida aos dias e convida (a uma caminhada na praia) a viver. O desafio é não nos resignarmos a entrar no Outono (ou, pior, no Inverno) da vida porque todo o mundo nos incita a isso. Se ela já tivesse casado, talvez visse a vida com os olhos dele e já tivesse perdido o seu Verão?

Algumas das canções da Shakira me permitiram rir de desgraças do passado – e, quem sabe, olhar com doçura para o presente. Depois dos 30, se não soubermos manter o bom humor vivo seremos (ainda mais) facilmente tachadas de mal-resolvidas, frustradas e (jaz aqui um termo que eu jamais usaria). A sociedade, além de não produzir obras e entretenimento para mulheres com 30 +, ainda persiste em nos tratar pejorativamente desde conversas de bar até comentários informais. Em outros tempos era também mais difícil para mulheres artistas com 30 +, visto que elas eram obrigadas (não que isso tenha acabado) a manter a persona da jovem mulher. Sabemos, inclusive, as consequências disso para muitas artistas do passado e de hoje.

A vida, enfim, é feita dessas pequenas alegrias, de, enquanto mulher com 30 + encontrar obras e artistas que ecoam em mim. O que torna ainda mais próximo é ver a relação dessas obras com suas autoras, em como elas se permitem abrir a vida e escancarar as experiências – porque sabem que não estão sozinhas e, de certa forma, nos dizem que nós também não estamos.

Sei lá, está chovendo e a vontade é sair caminhando pelas ruas, igual a JLo, com o coração leve, a vida plena, a segurança (que só o pós 30 nos dá) dos atos, palavras e experiências e com a certeza de que querer ser apaixonada, pela vida inteira, é uma excelente escolha.

(a inspiração da Shakira virá num próximo texto e, sim, tem a ver com café – pra completar que muitas de nós não precisam passar dos 30 para saber quem são)

* compartilhar: depois das redes sociais não consegui mais gostar desse verbo, prefiro em francês que fica mais bonito.


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