Era domingo e era dezembro. A vida soprou da janela com calma e os pássaros cantaram novos dias. Ainda bem que o tempo havia chegado, sem mais peso nem lamento. Juntamos tudo numa fogueira no jardim: queimamos o passado e o mal, as cinzas adubaram as roseiras. Este ano o jacatirão já floriu. Sorrio para as flores que eu cultivo contra cada braços cruzados e cara feia de quem furou o barco esperando que eu naufragasse. São anos de experiência no timoneiro.
As peças se encaixam no quebra-cabeça como água que rola pelo rio. Há um dom em alguns seres humanos de destruir o que é bom. Mantenho distância das fraquezas daqueles que não sabem ser quem são. Era dezembro, mais um belo ano chegava ao fim: eu nem no meio do caminho ainda estou. Cada dia, alguns leões, cada ano mais força de nem sei onde. Ou, sei muito bem.
Lágrimas vieram, de alegria. Eu sorria naquela sexta, noite adentrando as frestas da porta, esta porta e estas paredes tão velhas companheiras de grandes sonhos e muita luta – amor, sempre amor transbordando – eu sorria com lágrimas doces brilhando na escuridão. É preciso saber brilhar na escuridão. Quando apagarem a última vela, quando cortarem todos os fios, quando destruírem os postes, aí mais que nunca é preciso saber brilhar – algo assim que vem de dentro, do mais duro e profundo que posso ter.
Era a última sexta e era dezembro. Anunciam as boas novas, previsões não cansam de chegar, exibem-se a escancarar seus vazios e desesperos. Eu silencio. Ouço a luz que brilha em graças na janela. As nuvens são bom agouro. Aprecio o silêncio desde o início da manhã até alta madrugada. O ritmo pontuado pelo bem-te-vi a bater galhos na calha, em cadência com o sabiá a preparar a minhoca pro desjejum. Sempre foi fé. Quando nem mesmo eu sabia o que estava por vir, era fé. Quando souberem, já será tarde. Meu coração não olha pra trás.
No silêncio e na paz, você me visita em sonhos. Quem sabe mês que vem não apareça mais. Plantei jasmins no jardim e enterrei junto nossos sorrisos para que eles floresçam mais viçosos na próxima Primavera. Sim, vivo em saudades da Primavera – até lá já terei muitas mais histórias para contar e amores em poesia para cantar. Amores de Verão não sobem a Serra, os da Primavera não duram uma florada – qual o destino dos amores de Outono?
Sinto falta da poesia. Fiz promessas – sou dessas. Minha única promessa de Ano Novo. Não prometo nada aos outros, só a mim. Sou dessas. A poesia vai invadir os dias, as horas, as noites, as páginas. Sê fiel a si mesma. É preciso e preciso.
Amor não se conjuga. Amor é prática e precisa ser alimentado dia a dia. Quando eu me levantar amanhã, vou calçar os passos do Destino. A confiança passa pela sola dos pés descalços. É preciso despir-se de tudo, desnudar-se por completo o corpo e a alma. Não importa qual vestido ou sandália, é preciso descer do salto. Eu sempre soube, dezembro é tempo de eterno retorno.
Dezembro. Domingo. Sexta. Últimos… próximos passos a abrir portas e janelas ao Destino. Enxugo as lágrimas enquanto sorrio. O segredo é o amor que sempre esteve em todos os sorrisos.
Descubra mais sobre fahya.com
Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.
Deixe um comentário