Um dia eu conheci uma pessoa que dizia que o bom na vida era ter histórias para contar. Tudo o que acontecia ele resumia nisso, em mais uma história para poder contar. Eu achava isso um pouco chato, afinal não preciso de platéia, prefiro viver e viver não exige que você conte para os outros – não precisa nem que você compartilhe os momentos – o que viveu.
E um outro dia me peguei reparando que conto muitas histórias e tenho uma infinidade de histórias para contar. Sou chata, todo mundo sabe. Mas volta e meia (e os leitores atentos já devem ter reparado) tenho uma história, recente ou do passado, para contar. Me imagino daquelas velhinhas que contam infinitas vezes as mesmas histórias… ou nem tanto, afinal, apesar da pouca idade (tá, eu ri agora) já são tantas e tantas… das mais tristes às mais divertidas.
Quem sabe um dia eu escreva um livro de memórias. Começaria compilando muita coisa aqui do blog, mas sei que aquelas mais tristes (e, sim, são cortantes e não são poucas) eu sempre evito. Só na minha cabeça que elas rondam e rondam…
Ter boa memória é isso, viver é isso. É ir colecionando imagens e palavras de tantos momentos.
Nem pensem tão bem da minha memória, ela anda me pregando peças. E eu nem sei o motivo.
Porém, sim… eu lembro de quase todos e de quase tudo. Vou anotando mentalmente sentimentos, sensações, fatos, ações, palavras… Não sei também ao certo o motivo, mas prefiro viver assim.
E nessas anotações faço associações que não deveria. Tenho a péssima mania de associar as coisas e as pessoas aos lugares. Então, me mudei de cidade pensando em mudar, assim, de alma. Na nova cidade (tudo novo pra mim, por lá) eu ia descobrindo, passeando, amando. E como isso me fez bem! Ali eu me sentia eu, eu podia olhar o horizonte. Porém, não deixei de vez a cidade que eu havia morado antes. Por algumas poucas (mas muito fortes) razões. E eis que pra lá vou frequentemente e a associação às coisas ruins sempre foi inerente.
Aí a vida dá muitas voltas e já naquela não mais tão nova cidade eu havia sofrido e passado por coisas muito ruins. Tem lá aquela universidade, o jardim daquele cinema, aquele píer, um morro ou outro, uma casa lá pro Sul, um bairro… e é impossível passar pelos lugares e não lembrar disso tudo, de vez em quando. Mas o coração aqui não gosta de coisas ruins… aí a rebeldia anti-dor começou a gritar. A idéia de mudar novamente de cidade pairava sobre meus olhos. E só eu sei o quanto, apesar das lembranças, eu gosto desta cidade. Conflitos, conflitos… Numa reviravolta da vida, criei mais um motivo para não gostar da cidade para onde sempre volto. Mas foi lá que me refugiei nos dias mais difíceis.
Esses dias passaram… e eu achei que precisava dar um basta. Dizia eu para algumas pessoas, por esses dias, que é errado fazer essas associações. Nunca, jamais, abandonar uma rede social, deixar de frequentar lugares, cidades, deixar de fazer isso ou aquilo porque alguém nos fez/faz mal. Ninguém que te fez/faz mal muda a vida por sua causa, para te evitar, para evitar o teu sofrimento. Por que nós devemos fazer isso? Talvez tenha sido umas das coisas mais difíceis (e em processo) que já fiz.
Vejam só, pisei novamente no CFH. Resolvi sair da toca em Joinville.
Tudo isso engolindo o pavor que há anos me toma pelo fato de correr o risco de encontrar esse ou aquele. Engolindo o pavor das lembranças. Não é fácil. Não mesmo! Mas busquei em mim aquela coragenzinha filha da mãe que de vez em quando eu tenho. Nem tanto coragem, mas gosto pelo desafio.
Talvez eu tenha repensado tudo isso depois daquele belo encontro no Subway. Fiquei pensando quanto a falta de pretensão me faz bem. Eu já deixei de fazer tanta coisa, de estar em tantos lugares por causa de outras pessoas! Perdi boas coisas da minha vida e não hei de me permitir fazer mais isso.
Porque, enfim, eu duelo com a idealização. Duelo com saber como a pessoa é e, ainda assim, imaginá-la ali diante dos meus olhos de outro jeito. E aí, um dia… eu canso da minha idealização, me canso de esconder quão pouco interessante ela é, me canso de tentar fazer dela uma pessoa melhor enquanto ela fica ali, sem intenção alguma de ser o melhor dela pra mim.
Com os lugares também é assim. O CIC não tem culpa dos babacas que já conheci na vida. A UFSC não tem culpa (ai, difícil essa) dos tipos mais variados e infelizes que por lá circulam. As praias da Ilha também não. Certos bairros não podem ser responsabilizados pelas namoradas idiotas que meus amigos insistem em ter.
É um processo que eu resolvi fazer para poder sentir a delícia de, depois de muito tempo, poder colocar os pés no Sebo Colin novamente e me ver feito criança boba fazendo festinha em mim mesma e arrebatando as prateleiras para voltar feliz pra casa.
A coragem passa para o orgulho de poder assistir um bom filme, uma boa palestra, seja lá onde for. E se eu der de cara com aquela pessoa maléfica, uma das top 5 que já conheci na vida, eu vou rir e fazer de conta que nem vi. Ela não me importa. Afinal, se na minha colação de grau quem me deu o canudo e teve que apertar minha mão foi a criatura do departamento que mais me odiava, por que eu deveria me preocupar com alguma coisa? Já não tive provas o suficiente?
E é em exercícios de sobrevivência assim, conduzidos por altas doses de auto-análise e reflexão (e ultimamente de vinho também!), que eu encontro uma beleza peculiar da vida. A beleza de encarar as coisas e não se esconder delas. De dar a cara a tapa e saber revidar. Ou, simplesmente, de reaprender a viver. O processo não é fácil, mas eu detesto as coisas “fáceis” da vida. Eu gosto do desafio, do difícil, do complicado.
Concordo,masmordo a língua pois hoje estou onde estou e tudo começou na internet. Mas já não tenho a mesma paciência. Aliás, comecei a detestar muitas coisas.
Eu adoraria passar um dia batendo papo contigo!!
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Opa, comentei no lugar errado, era para o post mais recente…
Quanto a histórias para contar, o seguinte:
Eu tenho um tio-avô, hoje quase surdo, que é cheio de histórias para contar.
E talvez pelo fato de ele não escutar o que os demais dizem, ele tenha desenvolvido muito mais a arte de narrar e ver a reação das pessoas.
Desde criança eu sempre pensei: quando crescer, quero ser igual a ele – cheia de histórias para contar.
Acho fantástico ouvir sobre acontecimentos, lugares, aventuras, não canso.
Vivo a vida transformando tudo em histórias a serem contadas um dia e isso me traz felicidade, assim como ouvir outras tantas.
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Sim, só quem vive e é feliz tem histórias pra contar! Eu adoro ouvir essas histórias… e peguei o gosto por contá-las! (me vejo uma velhinha surda – excesso de fone de ouvido desde cedo! – falante, mais que hoje!)
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Morde a língua não! É isso que eu penso, na medida certa, é ótimo… o problema é não saber usar! Tu usou bem, só isso! 🙂
Acho que isso de detestar muita coisa é a história de depois dos 25!
Eu adoraria passar um dia batendo perna num mercado público de uma cidade diferente conversando contigo! 🙂
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E como você conta bem as “histórias”…Força para continuar a contá-las…
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