Quando você ajuntar as folhas da última estação
e não se desfizer delas
mas deixá-las num canto criando vida
Quando você acordar de madrugada sem sono
e sair da cama disposta a tudo
sentindo o ânimo incansável dos felizes
Quando você tiver saudade dos longos caminhos
e da sensação de não saber onde está
somente com a memória a lhe guiar
Quando você sair na chuva fraca do fim de tarde
e sentir os pés encharcados e sujos de barro
ao se dar conta que está longe de casa
Quando você não souber mais correr dos medos
e deles se desvencilhar um a um
como quem joga cartas de amor ao fogo
Quando você puder parar para dar colo
e cantarolar baixinho oferecendo confiança
sem perturbar a calma das boas almas
Quando você perder as chaves, os documentos
e tudo o que lhe prende a um lugar
mas, ainda assim, quiser voltar
Quando você pular o muro da vergonha
e der adeus curto e sincero aos limites
como quem desabrocha fora de época
Quando você duvidar se merece um abraço
e preferir punir-se por um crime inafiançável
mas alguém bater à sua porta às lágrimas
Quando você fugir dos seus pensamentos
e dos seus doces subterfúgios
como quem espreita uma boa oportunidade
Quando você for fiel à calma
e abandonar as palavras duras e frias
como quem passou pelo que não deseja a ninguém
Quando você anotar as datas mais importantes
não para lembrá-las ano a ano
mas para enterrá-las no calabouço do passado
Quando você esgotar todo seu empenho e esforço
e sentar-se no chão úmido e sujo da estrada
como quem deixa passar o último ônibus
Quando você sentir as dores dos outros
e nem reparar mais nas próprias cicatrizes
como quem doou amores
Quando você puder ser quem sou
quem sabe neste dia
nos encontremos.
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