Era um minuto. Aquele um minuto que não faria diferença nenhuma. Mas, você sabe, é o minuto que transforma a pontualidade no atraso. E atrasos são mal vistos. Atrasos são descontados. Eu tinha me tornado aquela pessoa que vivia de contar minutos, na minha vida eles faziam toda a diferença. Comprovei, naquele instante, que eu era agora essa pessoa que xinga no trânsito porque saiu dois minutos atrasada e se perder um sinal aberto parecerá o fim do mundo. Eu, eu tinha me transformado em quem eu nunca quis ser. Tinha alguns minutos para resolver: ou me odiaria para o resto da vida ou mudaria tudo agora.
O tempo e eu sempre fomos amigos, bons amigos. O transcorrer diário dele, inicialmente, era um problema. Mas até nisso consegui me dar bem. Eu não me importava com ele. Vivíamos bem. E começamos a ser escravos um do outro. Comecei a vender meu tempo. Comecei a ficar sem tempo. As linhas da agenda sempre escassas para tanto compromisso marcado, remarcado e acumulados. De amigos passamos àquelas duas pessoas que convivem próximas diariamente e não se suportam. Nem nos olhamos direito. É evidente, me odiarei para o resto da vida caso não faça nada a respeito, caso não façamos as pazes.
Minha maior vitória, por vezes, é num dia ter este tempo sagrado para duelar idéias. É ter o tempo sagrado de algumas páginas à luz do abajur no silêncio das cobertas antes de dormir – que nem o sono mais tem sido meu refúgio. Essa inimizade tem me custado horas de sonhos. Eu trocaria alegremente alguns dias inteiros por meia hora dos meus sonhos. Eu não queria ser a pessoa em quem eu me transformei.
Foi, então, naquele minuto, que decidi que precisava fazer alguma coisa – por mim. O tempo era meu amigo, continuaria sendo. Precisava dar um jeito. E foi quando me dei conta que eu tinha me transformado naquela pessoa que diz “pelo preço deste creme só se me deixar com a pele da Elisabeth Taylor”. Foi assim mesmo, na sequência. Eu era a pessoa que eu odiava. Que nunca tinha tempo e achava tudo caro. A vida, enfim, desse tal capitalismo selvagem resume-se à falta de tempo e ao dinheiro contado. Tudo resume-se a tempo e dinheiro. Eu sou quem eu odiaria pro resto da vida: em busca de tempo e dinheiro.
Estou presa neste instante. Seguirei sendo quem odiarei para o resto da vida ou há alguma saída, algum caminho que não me faça ser quem eu nunca quis ser? Há, ainda, ao meu alcance uma decisão que mude as consequências dos fatos? Posso viver com tempo e sem dinheiro?
Estou presa neste instante. No momento só odeio quem eu sou. Vejo no horizonte: ou ficarei indiferente ou a revolução se fará.
Deixe um comentário